Gente Boa era um jabuti muito legal. Foi adotado pela família quando o menor dos filhos ainda tinha três anos. No início, todos prestavam muita atenção a ele, no seu rebolado lento e sincronizado até as alfaces e aipos que lhe eram oferecidas. Era um jabuti muito calmo e tranquilo na sua juventude.
Assim batizado quando colocou sua patinha minúscula e enrugada na casa dos Pereiras, o gracioso jabutizinho era todo amores com a família, amigos e, principalmente, com as crianças. Todos diziam: “Cuidado para não deixá-lo muito perto do Dudu! Ele pode querer por suas mãozinhas nele e ele lhe arranca um dedo. Os jabutis gostam de morder.” Mas não foi assim. Tão logo ficou provado, empiricamente, que o animal não mordia de jeito nenhum, quem quer que fosse, apelidaram o réptil de Gente Boa por sua ótima conduta que transcendia sua essência biológica.
Mas Gente Boa mudou. Ele cresceu e virou um jabuti robusto adulto e começou a destruir toda sua boa reputação. Não se sabe bem ao certo quando ele se rebelou, mas deve ter sido a partir do momento em que Dudu não se chamava mais Dudu, e sim Eduardo. A família crescia e a tartaruga ia sendo esquecida. Já não recebia mais hortaliças e cafunés no pescoço pelancudo. Sua caixinha, que era sua casa, não era mais regularmente limpa e isso devia incomodá-lo profundamente. Por causa dos maus tratos, a falta de amor e compreensão da família, Gente Boa resolveu chamar atenção em um último ato esperançoso e desesperado.
Botou-se a correr desatadamente pela casa, correr no sentido de andar obstinadamente em passos de tartaruga, derrubando e roendo o que passava por perto. Eram mesinhas de centro e suas cristaleiras ornamentais, pastas e mochilas que eram largadas no chão, livros, revistas, pés de cadeiras e poltronas. Em menos de uma semana, o animal já recebia alguma atenção pelos seus atos delinquentes.
Imagino que Gente Boa estivesse satisfeito com o estrago e a atenção, porque voltou a se comportar. O engraçado é que atenção não voltou a diminuir e, ao contrário do que muitos possam pensar, o jabuti começou a ficar preocupado. Mais e mais vezes, escutava seu nome entre conversas da família e olharem deprimidos e melancólicos em sua direção. Os Pereiras estavam tomando uma decisão, provavelmente terrível...
Gente Boa ficava ainda mais preocupado a cada dia que passava e até parou de comer as recentes guloseimas que eram postas na sua casinha. Eles estavam querendo subordiná-lo com aquilo e ele não iria ceder! Além disso, a preocupação era tanta que ele tinha mesmo perdido o apetite.
Foi, então, que chegou o dia fatídico para o jabuti domesticado. Uma caixa relativamente grande, com alguns furinhos no topo e nas laterais, estava posta no centro da sala. Em cima, vinha escrito: MUDANÇA. Gente Boa não sabia ler, mas sabia o que era uma caixa com furos. Tratou logo de se acalmar e pensar no que iria fazer para fugir e não ser devolvido à loja de animais. Tentou pular da janela, sair pela porta dos fundos, mas sempre era recuperado a alguns passos do destino final.
Tentou fazer greve de fome e morder mais coisas. Inutilmente.
Nostalgicamente, Gente Boa começou a recordar do dia em que chegou e os olhinhos brilhantes de Dudu. Hoje, Eduardo tinha 25 anos e seus olhos não brilhavam tanto quanto antigamente. Ainda assim, volta e meia ele passava pela casa do jabuti pra lhe fazer um agrado, que foram reduzindo à medida que ele crescia. Gente Boa começou a se sentir deprimido. Afinal, estava conformado com seu destino cruel de abandono pela sua querida família. Só sentiu mesmo aquela pontadinha no seu coração de réptil por causa do descaso de Dudu.
No dia da mudança, Gente Boa foi resignadamente posto dentro da caixa. Com seu recipiente de água e comida, foi transportado com cuidado. Chegou a seu destino, preparado pra reencontrar alguns dos seus velhos amigos e outros animais mais novos. Mas não, não foi com a loja que ele se deparou. Foi com uma casa, recém pintada, com poucos móveis. Lá estava Eduardo e uma mulher, bem barriguda. Gente Boa não entendeu de primeira o que havia acontecido, mas tão logo nasceu Dedé tudo voltou a melhorar na vida de Gente Boa.
Assim batizado quando colocou sua patinha minúscula e enrugada na casa dos Pereiras, o gracioso jabutizinho era todo amores com a família, amigos e, principalmente, com as crianças. Todos diziam: “Cuidado para não deixá-lo muito perto do Dudu! Ele pode querer por suas mãozinhas nele e ele lhe arranca um dedo. Os jabutis gostam de morder.” Mas não foi assim. Tão logo ficou provado, empiricamente, que o animal não mordia de jeito nenhum, quem quer que fosse, apelidaram o réptil de Gente Boa por sua ótima conduta que transcendia sua essência biológica.
Mas Gente Boa mudou. Ele cresceu e virou um jabuti robusto adulto e começou a destruir toda sua boa reputação. Não se sabe bem ao certo quando ele se rebelou, mas deve ter sido a partir do momento em que Dudu não se chamava mais Dudu, e sim Eduardo. A família crescia e a tartaruga ia sendo esquecida. Já não recebia mais hortaliças e cafunés no pescoço pelancudo. Sua caixinha, que era sua casa, não era mais regularmente limpa e isso devia incomodá-lo profundamente. Por causa dos maus tratos, a falta de amor e compreensão da família, Gente Boa resolveu chamar atenção em um último ato esperançoso e desesperado.
Botou-se a correr desatadamente pela casa, correr no sentido de andar obstinadamente em passos de tartaruga, derrubando e roendo o que passava por perto. Eram mesinhas de centro e suas cristaleiras ornamentais, pastas e mochilas que eram largadas no chão, livros, revistas, pés de cadeiras e poltronas. Em menos de uma semana, o animal já recebia alguma atenção pelos seus atos delinquentes.
Imagino que Gente Boa estivesse satisfeito com o estrago e a atenção, porque voltou a se comportar. O engraçado é que atenção não voltou a diminuir e, ao contrário do que muitos possam pensar, o jabuti começou a ficar preocupado. Mais e mais vezes, escutava seu nome entre conversas da família e olharem deprimidos e melancólicos em sua direção. Os Pereiras estavam tomando uma decisão, provavelmente terrível...
Gente Boa ficava ainda mais preocupado a cada dia que passava e até parou de comer as recentes guloseimas que eram postas na sua casinha. Eles estavam querendo subordiná-lo com aquilo e ele não iria ceder! Além disso, a preocupação era tanta que ele tinha mesmo perdido o apetite.
Foi, então, que chegou o dia fatídico para o jabuti domesticado. Uma caixa relativamente grande, com alguns furinhos no topo e nas laterais, estava posta no centro da sala. Em cima, vinha escrito: MUDANÇA. Gente Boa não sabia ler, mas sabia o que era uma caixa com furos. Tratou logo de se acalmar e pensar no que iria fazer para fugir e não ser devolvido à loja de animais. Tentou pular da janela, sair pela porta dos fundos, mas sempre era recuperado a alguns passos do destino final.
Tentou fazer greve de fome e morder mais coisas. Inutilmente.
Nostalgicamente, Gente Boa começou a recordar do dia em que chegou e os olhinhos brilhantes de Dudu. Hoje, Eduardo tinha 25 anos e seus olhos não brilhavam tanto quanto antigamente. Ainda assim, volta e meia ele passava pela casa do jabuti pra lhe fazer um agrado, que foram reduzindo à medida que ele crescia. Gente Boa começou a se sentir deprimido. Afinal, estava conformado com seu destino cruel de abandono pela sua querida família. Só sentiu mesmo aquela pontadinha no seu coração de réptil por causa do descaso de Dudu.
No dia da mudança, Gente Boa foi resignadamente posto dentro da caixa. Com seu recipiente de água e comida, foi transportado com cuidado. Chegou a seu destino, preparado pra reencontrar alguns dos seus velhos amigos e outros animais mais novos. Mas não, não foi com a loja que ele se deparou. Foi com uma casa, recém pintada, com poucos móveis. Lá estava Eduardo e uma mulher, bem barriguda. Gente Boa não entendeu de primeira o que havia acontecido, mas tão logo nasceu Dedé tudo voltou a melhorar na vida de Gente Boa.
Wilma Dantec
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