terça-feira, 29 de setembro de 2009

Gente boa

Certa vez, estava Valdirene a caminho do mercado, quando ouviu falar do concurso “Gente Boa 2009”. Nunca houve nada parecido na pacata cidade de Brumadinho, confins de Minas. Toda a gente estava animada. Olha que até os jornalistas iam cobrir o evento! Valdirene não teve dúvidas. Queria ser gente boa. Só tinha um problema. Ela não fazia idéia de como fazer para ganhar o concurso. Ao vencedor, uma medalha e uma entrevista no jornal. Com foto e tudo! Começou a pensar. Não vinha nada à mente. Decidiu conversar com as pessoas. Só que não conhecia ninguém. Valdirene chegara à cidade há menos de um ano para tentar a vida em um lugar humilde. Em Belo horizonte, onde morava, não conseguia emprego. A concorrência é grande para quem tem pouco estudo. Tem sempre alguém mais preparado. Ainda não trabalhava em Brumadinho, mas tinha esperanças. Sabia fazer comida, arrumar casa como ninguém e levava jeito para artes manuais. Só que não conhecia ninguém. Então, como descobriria o que é ser gente boa. Foi então que ela bolou um plano. Não perguntaria de cara. É melhor falar aos poucos.

A igreja foi o lugar escolhido para começar. Lá ela soube que ser gente boa é ajudar o próximo, fazer caridade e rezar sempre. Foi o que fez. Sempre tinha um troco ou um pão para dar os mendigos, doava roupas e brinquedos para o orfanato da cidade e participava do grupo de oração da igreja. Não demorou a ser conhecida por todos de lá. O próximo passo foi se inscrever no concurso.

Só que um dia desses, na volta para casa, ela ouviu um grupo de rapazes comentarem que a Sabrina, filha do Gomes, era boa. Os motivos fariam corar um cantor de funk. Mas ela era boa. Isso poderia lhe tirar o futuro título. Descobriu que, para ser boa como a Sabrina, ela teria que fazer exercícios. Sorte que a pensão do pai deu para se matricular em uma academia. Em uma semana, aprendeu com os novos amigos todas as dicas para ser saudável e bonita.

Pouco a pouco, encontrar conhecidos na rua passou a ser comum. As pessoas faziam questão de apresentá-la a seus acompanhantes. Em troca, Valdirene retribuía com sorrisos e olhar atento. Gostava de ouvir a todos. Interessava – se pela vida deles e o que os faziam especiais. Mas ainda não sabia bem como ser gente boa.

Até hoje ela não entende como venceu o concurso. Afinal, não era boa como a irmã da igreja, nem como a Sabrina. Bem que tentou, mas essas coisas levam tempo. O que ela não sabia é que toda vez que alguém falava sobre ela, fechava a frase com: gente boa demais a Valdirene.
Papel

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